Esta rapariga não está a vender o corpo, sequer a exibi-lo em pose provocante. Assume naturalmente o que é seu, assumindo quem é de corpo inteiro. Nu, bonito e limpo como a verdade.
O
fotógrafo deve ter pressentido na rapariga a centelha de algo raro. Algo como
uma estreme candura - palavra que me detém, pensativo.
Há tanto tempo que não leio nem escrevo o vocábulo ou,
candidamente, algum seu derivado, e o pormenor prende-me numa conjectura que neste
momento não estou para atender (reina o despudor, o exibicionismo, a
coisificação das seduções femininas).
Pelos olhos que vêem estas imagens no powerpoint já mil outras imagens passaram com exposições de corpos
femininos despidos. Maquilhados e depilados a preceito, bem fotografados e em
poses insinuantes, provocadoras ou mesmo obscenas, esses corpos não deixaram na
retina a menor impressão.
Porém, relembro com clareza as imagens desta rapariga nua
com a bicicleta verde que tornei agora a receber (e a “reler”), enviadas por
mão amiga certamente depois de rodarem por meio mundo.
Já as conheço e reconheço e, no entanto, estou a
revisitá-las com simpatia.
A hipocrisia das convenções correntes estabelece, nestes
casos, a condenação sumária da moça e de quem, assumido mirone, com descaro
isto escreve. Mas eu, desafiado, preciso de apontar a assunção do próprio corpo
onde este se revela, natural como a juventude, porque é atitude bastante mais
rara do que pode supor-se.
A nudez cândida nada tem a esconder. É sincera e honesta
sem artifício e também, por vezes, corajosa. Eis o que a moça me comunica, a
sorrir, nas diversas posições que toma de bicicleta na mão, com a franqueza
simples da prática naturista.
Aparece num campo ervado, talvez perto de casa ou de algum
moinho, iluminada pelo esplendor sanguíneo de um poente que lhe põe a luzir o
ínfimo pelame dos relevos da sua grácil anatomia.
Imagino-a holandesa. E mais, que o fotógrafo seria seu
namorado (porque, sem dúvida, o fotógrafo gostava dela). Mas, vamos supor, os anos correram, a moça casou, rodeia-se
agora de crianças.
Guarda consigo, no fundo da arca, junto com as recordações
mais íntimas, estas fotografias que revê com gosto e nostalgia. Recordam-lhe a frescura daquele corpo que foi seu.
Lembra-se então de quando se deu pela primeira vez ao namorado tendo na memória
a observação atenta que antes fizera ao espelho da beleza do seu corpo e de ter
sentido no beijo que recebia que era aquele seu mesmo corpo lindo que a beijava
através do seu rapaz...
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