segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Martha Nussbaum: autora off-side?


Martha Nussbaum (na foto) nasceu em Nova Iorque em 1947. É autora prestigiada e notória de numerosos livros sobre filosofia, justiça, educação, desenvolvimento e ética, entre outros relacionados com as ciências sociais, área em que o prémio Príncipe de Astúrias a distinguiu em 2012. Realmente, muitos desses livros estão vertidos para espanhol - tal como o abaixo citado (ebook) - mas, veja-se, apenas um saiu em Portugal!
Foi o caso de Educação e Justiça Social, traduzido por Graça Lami e editado na colecção Pedago, em Mangualde, em 2014. A BN regista também um texto policopiado, de 2006, intitulado “O conceito de justiça poética em Martha Nussbaum”, por duas autoras. Tão escasso resultado desperta atenção e levanta a interrogação: porquê?
Martha formou-se em Harvard, onde ensinou filosofia e literaturas clássicas, depois mudou para a Universidade de Brown e, por fim, para a de Chicago. Tornou-se desde logo referência em foco ao publicar Aristóteles, De motu animalium, em 1978. As suas obras posteriores, focadas na filosofia e no direito, incluem Sexo e Justiça Social, obra de 1998, Mulher e Desenvolvimento Humano, 2000, e Emoções Políticas: porque o amor importa à justiça, 2013
Desde os anos ’80, Martha colaborou com o economista Amartyn Sen, prémio Nobel, sobre temas ligados a desenvolvimento e ética. Vale a pena citar uma outra obra significativa da autora: O Ocultamento do Humano: repugnância, vergonha e lei, de 2004. Estes títulos aparecem aqui com os originais traduzidos para melhor explicitação.
Assim se levanta, em torno desta autora, uma dúvida: estará ela off-side? Com um livro apenas editado em português (e decerto para fins pedagógicos, livro que nem terá atingido o mercado), a estranheza do caso justifica-se. Onde estará escondido o motivo que impede Martha Nussbaum de ser lida em Portugal?
Motivo tão singular talvez possa encontrar-se no texto saído na revista da Unesco “Courrier Internacional”, edição portuguesa nº 175, Setº, 2010. Condensa o primeiro capítulo do livro Not for Profit: Why Democracy Needs Humanities, ed. 2010 (Não por Lucro: Como a Democracia precisa de Humanidades), cap. “Uma crise planetária da educação” traduzido por Ana Cardoso Pires. As primeiras linhas bastarão para nos esclarecer. Escreve Martha: “Atravessamos actualmente uma crise de grande amplitude e de grande envergadura internacional. Não falo da crise económica mundial iniciada em 2008; falo da que, apesar de passar despercebida, se arrisca a ser muito mais prejudicial para o futuro da democracia: a crise planetária da educação.
Estão a produzir-se profundas alterações naquilo que as sociedades democráticas ensinam aos jovens e ainda não lhes aferimos o alcance. Ávidos de sucesso económico, os países e os seus sistemas educativos renunciam imprudentemente a competências que são indispensáveis à sobrevivência das democracias. Se esta tendência persistir, em breve vão produzir-se pelo mundo inteiro gerações de máquinas úteis, dóceis e tecnicamente qualificadas, em vez de cidadãos realizados, capazes de pensar por si próprios, de pôr em causa a tradição e de compreender o sentido do sofrimento e das realizações dos outros.
De que alterações estamos a falar? As Humanidades e as Artes perdem terreno sem cessar, tanto no ensino primário e secundário como na universidade em quase todos os países do mundo.”
Porque será que as Humanidades e as Artes ficaram off-side? Martha, atingida, aponta o motivo: são “Consideradas pelos políticos [como] acessórios inúteis”!

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