O termo veio do alemão e tem utilização crescente. Um vulgar dicionário
regista o que significa: “produto artístico, literário, de utilidade doméstica,
etc., de qualidade inferior, mas com cunho sensacionalista, que pretende ir ao
encontro do gosto popular.” Assunto esclarecido e encerrado?
Não, está em esclarecimento e continua aberto. Assunto agora reavivado pelo
contributo de João Medina (“O Kitsch
português, reflexões sobre o inautêntico na história cultural lusa”) publicado
há dias num blogue (http://malomil.blogspot.pt/2013/11/o-kitsch-portugues.html). Agradeço ao
prezado amigo que mo trouxe ao conhecimento.
O termo, na origem alemã, deriva de “atamancar” (obra mal feita) ou impingir como boa coisa de qualidade inferior. Mas, em Portugal, em alguns círculos sociais, o kitsch até tem categoria próxima do belo ainda que, agrega o dicionário, seja “manifestação cultural ou artística que explora estereótipos sentimentalistas, melodramáticos ou sensacionalistas”. Porém, o sentido real do termo é obviamente pejorativo: é tendência, expressão ou conjunto de objectos considerados de mau gosto ou de má qualidade por terem características associadas ao gosto popular.
O trabalho do Prof. João Medina – um ensaio muito ilustrado – desfaz quaisquer confusões assentando desde logo no conceito do que deve entender-se correctamente por kitsch. Abre com epígrafe do ensaísta Abraham A. Moles, autor de basilar livro sobre o tema: “O mundo dos valores estéticos deixou de ser dicotomizado entre o Belo e o Feio; entre a arte e o conformismo estende-se a vasta praia do Kitsch.”
Para Moles, a civilização do consumo produz a cultura de massas, identificável como kitsch. Surge a indagação: poderá a produção industrial ser arte?
Vem a seguir uma outra epígrafe, do espanhol Antonio Muñoz Molina (“«Kitsch» nacional”, Babelia, 21-IX-2013), e é extensa: “…o kitsch é o império dos espaventos descontrolados da emoção e a sensibilidade, da desproporção entre a substância e o invólucro (…). O kitsch define-se por comparação porque a sua natureza é derivada e parasitária. O kitsch está para a arte como a margarina para a manteiga, o Arcopal para a louça, o romance histórico para a História, a Isabel Allende para o melhor Garcia Marquez, (…). O que os anúncios turísticos da Junta da Andaluzia para a realidade da Andaluzia (…). O kitsch é inseparável da efusão nacional porque esta consiste na translação para o público daquilo que em rigor pertence ao âmbito das emoções privadas. (…).”
Estabelecida a abordagem correcta e precisa da questão em foco, João Medina passa a aplicar o conceito exposto ao “kitschismo” acéfalo que invade a realidade portuguesa sem esquecer ideologias e doutrinas conservadoras. À literatura (os best-sellers José Rodrigues dos Santos, Margarida Rebelo Pinto, ou Dan Brown, Leon Uris, etc.) e à arte (Joana de Vasconcelos, José de Guimarães, o Malhoa de “O fado”, etc.) segue-se o teatro, o cinema, a arquitectura, a música… Acende-se, inevitável, a polémica e aí vem a discordância caceteira pedir desforra das “ofensas”. Enfim, o que é kitsch? [Imagem: cartaz-réplica do conhecido quadro "O Fado", de José Malhoa; autoria omissa.]
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