Manifestar o direito público à liberdade de expressão evidenciou desde logo a índole conformista do gesto: encobria que a informação da actualidade fornecida pelos media, sendo incompleta, parcial, tendenciosa, serve cada vez mais a Verdade Única do pensamento dominante. Resultou numa manobra descaradamente populista e, na presente situação da prática objectiva do jornalismo, também hipócrita e algo cínica. A informação e o jornalismo estão sob um crescente controlo que filtra o que aparece na imprensa, na rádio e na televisão, em obediência a um breviário de “verdades” assentes contra o que seja tomado como de esquerda.
Defender a liberdade de expressão no actual contexto? Seria pouco, se isso valesse a pena. Muito melhor seria denunciar a manipulação, a parcialidade, o seguidismo massificador da informação que as empresas de comunicação social servem ao público e pedir outra, diferente, capaz de ouvir sempre o “outro lado” das questões.
O que aconteceu acirrou os ânimos já aquecidos pela conflitualidade atiçada entre radicais muçulmanos e cristãos; o radicalismo islâmico ganhou mais base e a direita europeia, festejando, cresceu. De súbito, a União Europeia viu-se a cair nos braços abertos da América. Com os seus milhões de desempregados e a baixa dos salários imposta pelos programas da austeridade + estagnação económica, a zona euro dispensa a barateza do “canalizador polaco” e a emigração clandestina da margem sul do Mediterrâneo, pelo que se propõe rever o acordo de Schengen da livre circulação, até porque a ameaça jihadista também mora cá dentro.
Este velho e retalhado continente ficou mais inseguro e ameaçado, além de mais intolerante e xenófobo, isto é, mais afastado da Liberdade, Igualdade, Fraternidade carimbada nos direitos humanos. No mundo de hoje, o terrorismo, venha de que lado vier e que sinal tiver, presta-se a aproveitamentos oportunistas e a conspirações obscuras de interesses ideológicos e políticos contraditórios, em função de estratégias e propagandas mistificadoras tão confusas que já parecem compor um cenário pré-bélico. O jornalismo de uma imprensa livre iria naturalmente investigar cada situação, mas, nas presentes circunstâncias, nem espaço lhe sobra para questionar, por exemplo, porque foram abatidos os alegados dois irmãos do atentado ao “Charlie”, tal como o indivíduo que interveio na loja kosher, assim como abatidos foram, sem interrogatório policial nem julgamento, Sadam Hussein, Khadafi ou Bin Laden.
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