Foi, no seu tempo, um homem e um artista algo peculiar. Nasceu em Valadares, Vila Nova de Gaia, em 01-11-1912 (28 de Abril de 1913 no registo civil). Terminou em 1937 o curso de Pintura na ESBAP (Escola Superior de Belas-Artes do Porto), onde foi assistente entre 1962-1965, e dedicou-se ao ensino secundário em Guimarães. Destacou-se sobretudo na pintura afresco e na tapeçaria com obras de grande projecção, mas trabalhou também, de modo distinguido, o mosaico e a pintura a óleo. Em 1987 recebeu medalha de ouro da sua cidade natal e foi publicado um livro sobre a sua vida e obra.
Correspondeu amiúde a “encomendas” em tal medida que realizou poucas exposições individuais, pois se considerava “um operário no exercício da sua arte”. Só na igreja da Conceição (Porto), Camarinha pintou dez afrescos com 90 metros quadrados que levaram “um ano e meio a executar”. A sua arte em mosaico, que desenvolveu em contacto com um artista veneziano (de modo que espelha toques de expressão bizantina), enriqueceu numerosos edifícios em Portugal e no estrangeiro.
O crítico Joaquim Matos-Chaves situou Camarinha no segundo modernismo português, sublinhando nas suas obras o perfeito domínio de cada técnica, “onde um afresco é pensado como um afresco, uma tapeçaria como tapeçaria, um óleo como óleo”. Por outro lado, Amândio Silva evocou a admiração que desde cedo as suas obras causavam nos alunos de Belas-Artes do Porto pela expressão plástica pessoal, a sua modernidade. De facto, o artista gaiense integrou, no início dos anos ’30, o “Grupo Mais Além”, com Augusto Gomes e Domingos Alvarez, entre outros.
Ao longo dos muitos anos da sua vida, Camarinha executou quase duas centenas de tapeçarias para tribunais, paços do concelho, bancos e outras entidades nacionais e estrangeiras. Os cartões que concebia eram habitualmente elaborados na fábrica de Portalegre, o que contribuiu então, fortemente, para a reabilitação da respectiva técnica no espaço nacional. De alguma maneira, isso fez ecoar em Portugal um movimento que em França tinha à frente a fisionomia de Lurçat. E lembra a peculiar relação estabelecida pelo artista com a cultura francesa.
Nas suas obras abundam sinais da herança greco-latina, numa linha neofigurativa com citações frequentes de temas clássicos em que se fundem e confundem especiais efeitos de teatro e de literatura.
Conheci-o, já idoso, e conversámos umas vezes. Guilherme Camarinha, apegado a um passadismo irredutível,
lamentava a Revolução Francesa (isto é, a perda do ancien regime) junto com toda a evolução posterior da história do mundo. Morreu em 1994, na sequência de um atropelamento. Ia nos 82 anos. Viveu sozinho na sua casa, em Vila Nova de Gaia, e conservou-se celibatário embora deixando descendência. [Imagem: tapeçaria do Autor alusivo a tema histórico.]
1 comentário:
Um artista amigo, Avelino Rocha, também de V. N. de Gaia, que comigo acompanhou de perto Camarinha, disse-me em data recente que a filha e sua única herdeira foi vigarizada. Perdeu a herança! Residente na Suíça, nomeou seu procurador um advogado para lhe tratar da herança em sua representação; o advogado vendeu tudo e abalou daqui para o Brasil... Arsénio Mota
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