quarta-feira, 28 de maio de 2014

Agostinho Neto, poeta

Sei um pouco dos esforços que o Prof. Pires Laranjeira desenvolve há longos anos no sentido de afiançar no plano literário geral o esplendor da poesia de Agostinho Neto. Penso que leva bem mais de trinta anos nesses esforços para evidenciar a valia, discreta mas agora, por fim, plenamente evidenciada. Saiu uma obra consagradora monumental que reúne, de forma quase antológica, um manancial de textos de autores que em variados países comentaram enaltecendo a obra poética netiana.
Organizada por [José Luís] Pires Laranjeira e Ana T. Rocha e publicada pela Fundação Dr. António Agostinho Neto (Luanda: 2014, 814 pp), a obra é realmente fundadora. O título, A Noção de Ser, legenda perfeitamente o percurso biográfico do Autor no quadro afim do processo histórico que fez sair Angola do colonialismo e erguer-se como nação e Estado. A consagração de Agostinho Neto (1922-1979) enquanto poeta fica completada e torna-se definitiva.
Realmente, Neto não foi só dirigente do MPLA desde 1962 e o primeiro presidente de Angola em 1975. Formou-se em Medicina na então “metrópole” e aqui publicou os seus primeiros poemas. Escassa produção poética: Sagrada Esperança data de 1974 e a sua segunda obra, A Renúncia Impossível, já é póstuma (1982).
Obra poética escassa mas, ainda assim, não negligenciável. Pires Laranjeira, investigador de culturas africanas da Universidade de Coimbra e apreciador atentíssimo, notou a poderosa irradiação contida nos poemas onde se cruzavam intuições da pessoa singular do Autor com o seu porvir na tela da emancipação do seu país e do seu continente. Em breve muitas outras vozes rodeavam a poesia netiana de autêntica admiração, senão mesmo de veneração.
A Noção de Ser recolhe um manancial, cerca de setenta textos escolhidos sobre a obra poética de Agostinho Neto arrumados em várias rubricas: formação do homem e escritor, análise da obra, intertextualidades, recepção, etc. A consagração efectiva-se nessa extensa base documental qualificada. Os autores pertencem a diversos países, línguas, culturas e formações diversas, de modo que o aplauso geral não poderia ser mais convincente.
Além de Eugénia Neto, viúva do Autor, e dos organizadores da obra, destacam-se no elenco os nomes de Leonel Cosme, Fernando J. B. Martinho, Manuel Simões, Alexandre Pinheiro Torres, Alfredo Margarido, Inocência Mata, Xosé Lois García, Salvato Trigo, Manuel Ferreira, Urbano Tavares Rodrigues, Costa Andrade e Jorge Amado. Outros autores serão menos conhecidos dos leitores portugueses.

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