O conhecimento e o debate aberto das questões relacionadas com o direito dos autores continuam ainda a ser entre nós frouxas, incipientes. Entre nós, quero dizer, os autores literários e os nossos leitores. Nesta situação, quase me persuadi, por vezes, de que tanto para nós como para quem nos lê, as questões do copyright seguem a regra natural: são toleradas quando contemplam autores e obras afamadas e, nos casos restantes, são nulas por serem injustas e discutíveis se não as vemos cair do céu como chuvas benfazejas.
Ora eu pertenço à esmagadora maioria dos autores que não aparecem na ribalta, iluminados pelos luzimentos da fama. Mas declaro aqui o meu (des)interesse: o que sobretudo me importa desde sempre é poder escrever em liberdade e também em liberdade ser lido. Mas nem um autor nada famoso como eu, que prefere estar no seu lugar pequenino para que possa mantê-lo limpo, está com as suas obras protegidas contra abusos e atropelos.
Descobri recentemente que tinha um livro integrado na biblioteca Google! Livro, portanto, digitalizado. Com que direito e apropriação autorizada por quem (pois o autor não foi tido nem achado para nada)?
É Biografia Fantástica, caderninho 12 x 17 cm, de 53 páginas, edição do autor, impresso em 1960, em Aveiro. Foi, por sinal, a primeira obra que assinei com este meu nome. No entanto, a minha estreia é anterior, de 1955: dois cadernos de poemas publicados em Coimbra por “Arsénio de Bustos”.
Que forças misteriosas terão agido na sombra para pegarem na minha esquecidíssima estreia em prosa, da qual saíram apenas 250 exemplares? Tentei averiguar e apurei que o caderninho esteve presente na biblioteca da Universidade de Wisconsin, Estados Unidos, onde foi digitalizado. Depois aconteceu o que todos sabemos: a biblioteca mundial Google foi criada com os espólios de uma quantidade de bibliotecas, fundos editoriais e arquivos… e lá foi a “Biografia Fantástica”.
O autor declara, para todos os efeitos morais, que é inocente de todas estas tropelias embora reconheça que tudo isso é verdadeiramente fantástico. Quem disser que existem direitos dos autores reais e efectivos está longe deste mundo. Mas quem quiser poderá ir a books.google.books e conseguir ler o caderninho (para minha vergonha) cheio de falhas e descuidos de revisão, que escrevi com nervos e raiva contra a pasmaceira dos domingos ocos daquele tempo.
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