Estas pinturas são sinceras num sentido específico. Tentam, quadro a quadro, plasmar vivências autênticas sentidas no plano existencial da artista fazendo-o com a violência do grito que no peito amarrado permanecia. Cada tela surge-nos como um registo de emoções fortes ou de estados de alma que se organizam plasticamente em torno da interrogação a que a pintura final responde.
Daí advém a “marca de água” notada nestas pinturas, caracterizadas por um intimismo quase lírico, que se traduz afinal numa poética muito personalizada. Notou-o bem o crítico Fernando Pernes nas breves palavras que escreveu, já doente, em catálogo (Árvore, 2007), ao perceber que esta pintura anuncia sem dizer. Temo-las, porém, tangíveis pelo olhar. E eis porque estas obras convidam a uma contemplação silenciosa, propiciadora de idêntico intimismo aberto realmente para uma comunicação poética.
Significativamente, a pintora prefere telas de medianas ou mais avantajadas dimensões, muitas vezes de formato quadrado ou quase quadrangular e telas outras tantas vezes justapostas (dípticos, trípticos…), de modo a poder expandir o impulso vital irreprimível. São pinturas de formas elementares - isto é, essenciais -, depuradas de todo o elemento acessório. De facto, a artista cultiva uma pintura despojada de toda a encenação, no rigor que recusa qualquer cedência ao efeito fácil, apostando sempre numa autenticidade que chega a sugerir alguma aproximação tendencial ao minimalismo. Pintura, portanto, que joga com elementos mínimos: linhas, manchas texturadas, símbolos (círculos, anéis duplos, espiral), e raras figuras humanas, distantes, a vir ou a ir.
Pode certamente dizer-se que esta pintura se envolve de mistério tentando narrar estórias do real vivido. Mas o que exprime, quadro após quadro, para além de qualquer dramatismo, é uma procura de equilíbrio tranquilizador, um anseio fundo de harmonia. A procura tem acentos ora melancólicos ora irónicos, e, todavia, o efeito é sempre o de uma serenidade atingida, realçada inclusive pelo formato e o tamanho das telas.
A pintora diz, querendo explicar-se, que na composição destas telas “procura uma lógica tranquilizadora que se inspira talvez no conhecimento científico”, o da própria pintora. Sente-se aqui a predominância da mentalidade tecnocrática, o distanciamento da pintura do que acontece na rua e é “social”. Todavia, a pintora quer conseguir exprimir-se de uma vez por todas, completamente. Mas assim se obriga a prosseguir, como quem resvala, de quadro em quadro... [Cópia parcial de escrito em catálogo de exposição.]
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