quinta-feira, 2 de abril de 2015

Exposição (bem) notada

Há tempo que andava a desejar ver as mais recentes obras do artista plástico Acácio de Carvalho. É um excelente amigo e companheiro de vária lida, merecedor da nossa melhor atenção, e, no entanto, para mim, a ocasião tardou. Mas aconteceu agora, com os seus “Traços”.
Como amigo excepcional, merece aqui nota excepcional. Acácio acabou de se formar em Belas Artes, no Porto, em 1980. Além da pintura, tem trabalhado em cenografia para teatro e cinema (mestrado em Boston, EUA), foi designer gráfico no JN, docente de Artes e Ofícios da ESE também do Porto e, enfim, averba um vasto e distinto percurso distinguido com prémios e outros galardões.
A exposição abriu há dias na galeria Porto Oriental, onde vai permanecer até início de Maio. Apresenta 17 pinturas: seis monotipias, três desenhos e oito “Traços” de grandes dimensões com datas entre 2001 e 2010. Acácio é artista sensível e versátil: usa acrílico, pastel seco, carvão ou técnica mista conforme a expressão que pretende plasmar, isto é, evidenciando um completo à vontade, e suportes como tela (cabedal ou napa), papel ou mesmo papel vegetal.
Os “Traços”, até pelo seu tamanho, mas não só, impõem-se ao olhar desde logo pela força cromática. Cada quadro é formado por peças irregulares de tela, natural ou sintética, a cores, cosidas manualmente com fios, com pontos de formas muito diversas ou unidas por ilhós. O resultado é poderoso.
Manuela Bronze, outra artista plástica, no texto inserido no desdobrável que acompanha a exposição (com epígrafe de Tápies), considera que estas obras “criam uma linguagem plástica pronta a sujeitar-se à interpretação do espectador”. Por outras palavras, interrogam-nos e, do mesmo passo, questionam os caminhos que vem seguindo a Pintura. Deixam-nos a pensar mesmo depois de sairmos da galeria (site: www.galeriaportooriental.com).
As monotipias contribuem também para reforçar este sentido ao colocar-nos, sem dúvida intencionalmente, perante manchas escuras ou cinzentas, isto é, múltiplas texturas, que, além de revelarem os processos da criação utilizando “criativamente matéria, ferramenta, gesto, memória e linguagem”, conforme assinala Manuela Bronze, trazem até nós ecos das perplexidades geradas pelo alastrar das escuridões no mundo. Quando irá soprar uma aragem nova para varrer do planeta estes tantos negrumes? [Imagem:“Traços III”, acrílico, grafite e pastel-seco s/tela, fios, cabedal, 200 x 142 cm, 2010.]

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